quarta-feira, agosto 06, 2008

ALABÊS E OGÃS

De acordo com a "Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana", o significado da palavra "Alabê" é a seguinte, in verbis:

Músico ritual da orquestra do Candomblé. É necessariamente um Ogã submetido aos rituais de iniciação. O nome designou, originalmente, e em especial na mina maranhense, o tocador de agbê (alagbê, "o dono da cabaça"), tendo dai ampliado seu sentido.

Dentro da hierarquia do Candomblé, temos vários tipos de Ogãs, dentre eles aquele que não tem cargo ritualístico dentro da "Roça", mas que ajuda financeiramente na sua manutenção. Outros Ogãs, dentro da Nação Jeje, são responsáveis pelo altar e outros "axés" da Casa (Pejigan), o sacrifício ritual (Axogun), dentre outros. No caso do Alabê, note-se, ele é o "maestro", o "chefe" dos demais Ogãs, sendo que à ele é reservado o maior ilu (atabaque) chamado de Run, sendo assim conhecido como Alabê-Runtó.

No caso dos músicos, temos também a denominação de fongbé houn hô tô que pode ser traduzido, literalmente, como "tocador de tambor".

Podemos perceber, portanto, que tais termos e cargos dentro do Candomblé, em sua maioria, vem da Nação Jeje, relativa ao chamado grupo daomeano, cuja a mais famosa "Roça" é a Casa das Minas, em São Luiz do Maranhão.

A questão que coloco, portanto, é: o que tudo isto tem com a Umbanda?

É, para dizer o mínimo, contraditório, alguns segmentos dentro do movimento umbandista se mobilizarem para festejar o centenário da Religião, cantarem loas ao Caboclo das Sete Encruzilhadas e ao seu médium Zélio Fernandino de Moraes, reconhecerem que foi a partir deles que a Umbanda (re)nasceu, mas não seguirem os princípios que deixaram.

Por mais que eu pesquise, não consegui uma só referência do uso de atabaques ou sacrifício de animais (assunto que será tratado no texto de amanhã) nos rituais da Tenda Nossa Senhora da Piedade ou em qualquer outra fundada pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas. Estes elementos, portanto, são alienígenas, estranhos à ritualística da Umbanda.

Não irei tecer comentários sobre a minha visão doutrinária em relação ao uso de atabaques, roupas, apetrechos e sacrifícios dentro da Umbanda, já que em outros textos já fiz isto. Mesmo porque quem conhece as obras de Matta e Silva, doutrina que sigo, sabe bem que não somos a favor destas coisas por motivos energéticos e espirituais.

Este não é o ponto.

O ponto é que enquanto há uma profunda mobilização de setores do Candomblé, à exemplo do empenho da respeitável Mãe Stella d' Oxossi do Ilê Àsé Opô Afonjá, para acabar com a influência ariano-cristã, a Umbanda, uma religião genuinamente brasileira (como adoram alardear por ai), está sendo cada vez mais africanizada.

Antes que os puristas (hipócritas) de plantão venham atirar pedras em mim, nada tenho contra a cultura negra, pelo contrário. Minha ascendência é européia-afro-ameríndia, como a da maioria dos brasileiros. Gosto de percussão, samba, pagode e tenho excelente relacionamento com vários Babalorixás e Yalorixás do Candomblé, do Omolokô e de outros segmentos da Umbanda.

A minha questão não é ter algo contra a "cultura da senzala", como disse Ney Lopes na sua infeliz entrevista. O que evoco é a coerência, coisa que tem faltado, e muito, neste tempos de "conselhos", "faculdades" e mobilização política.

Esta "umbanda do vale-tudo" que apregoam por ai, nada mais é do que uma forma rasteira de angariar simpatia e, consequentemente, aliados para os projetos megalomaníacos de uns e outros. Tudo é válido, tudo pode, mesmo que sejam práticas antagônicas, como Umbanda e Catimbó, por exemplo.

Isto não é identidade, muito menos convergência. Isto se chama CONVENIÊNCIA.